23.7.08

Sabedoria

Aguardando recentemente no aeroporto a saída das malas dos meus filhos tive o prazer de conversar com uma “mulher do povo”, uma peixeira da Nazaré, que viveu antes do “glorioso” e apesar de não ter tido a possibilidade de estudar, e talvez e em grande medida por essa mesma razão, tem dessa mesma época, tão denegrida pelos jornalistas “de agora”, uma grata recordação. Como é possível que uma vítima da “exploração capitalista” (algo que o “glorioso” erradicou para todo o sempre de Portugal, tendo introduzido no seu lugar algo de desconhecido na época, a “exploração estatal”) não dê “Hossanas” aos cravos? Contava-me ela que tendo feito parte do grupo folclórico nazareno, “Tá-Mar”, foi uma vez actuar a Sta Comba Dão para o então Presidente do Conselho. A visita, segundo me disse, confirmou a imagem que tinha dele: um homem simples, humilde e acessível. Imagem essa que contrastava com a que dele tinham muitos dos “doutores” (para utilizar a sua terminologia) com quem contactava ao vender o peixe, e que mais tarde já depois do 25 de Abril alguns deles, perante o descalabro de Portugal ao qual assistimos diariamente, tiveram a humildade de reconhecer o quanto estavam errados. Cada vez que tenho a possibilidade de falar com alguém com este “perfil sociológico” ocorrem-me as palavras de Cristo no Evangelho do passado dia 6 (Mateus XI, 25-30):

«Bendigo-te, ó Pai, Senhor do Céu e da Terra, porque escondeste estas coisas aos sábios e aos entendidos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque isso foi do teu agrado

Porque será que aquilo que é óbvio para esta senhora humilde não o é para os “doutores”? Qual o “segredo” desta empatia dos “pequeninos” pelo grande estadista? Creio que talvez seja essa a grande virtude de Salazar, a capacidade de ser simultaneamente enorme e mantendo-se sempre próximo dos humildes. Pergunto: quantos dos “conducatores abrilinos”, que no máximo terão direito a uma nota de rodapé num qualquer manual de história, poderão passar no “veredicto da história” vendo-se assim “libertos da lei da morte por obras valorosas”, como diria o nosso bardo quinhentista?

10.7.08

Comunismo I

Li com grande interesse o artigo de Peter Hitchens que o Corcunda colocou lá no Pasquim. O artigo é riquíssimo pela variedade de questões que levanta e que se prendem, com a essência do próprio comunismo, com o seu ocaso, com a imensa dificuldade que os países que a ele estiveram submetidos têm em libertar-se da sua “pesada herança”, com a sua sobrevivência enquanto ideal nos países ocidentais que nunca o “sentiram na carne” para utilizar a expressão de Revel, e ainda como gradualmente e sem violência estamos ao cercear da liberdade no Ocidente. Creio que cada um destes aspectos só por si já daria muito que escrever. Tentarei apenas abordar cada um deles sumaria (por manifesta incapacidade) e separadamente mesmo sabendo que estão interligados. Além disso o facto de o fazer separadamente permitir-me-á ter motivos para vários posts para os próximos tempos tanto mais que infelizmente nos últimos tempos e por razões profissionais tenho estado apartado da blogosfera.
Creio poder afirmar que o Ocidente jamais compreendeu o fenómeno totalitário do sec. XX e, mais concretamente, o comunismo que, apesar das suas sinistras proezas, continua a ser visto como algo de intrinsecamente bom que apenas foi sistematicamente “desvirtuado” por todos aqueles que debalde o tentaram implantar, é por isso pouquíssimas pessoas previram a sua queda. Poderíamos citar muitos exemplos mas limitar-me-ei a dois. O primeiro a atitude ocidental, mesmo por parte de dirigentes considerados à direita como Tatcher, face a Gorbatchev, e consequentemente ao comunismo, que sempre consideraram que o regime era reformável, bastando para tal ajudar o seu líder enviando-lhe os fundos necessários para tão nobre, quanto utópica, tarefa. Já mais próximo da actualidade veja-se como o carrasco dos cubanos e traficante de droga, Fidel de Castro, é acarinhado pelos media que o mostram como alguém de bom e amado pelo seu povo que, apesar da miséria, vive feliz no goulag tropical. Penso que a melhor imagem que se pode dar do comunismo é a de um tumor que, tal como este, vive da depredação do organismo que o alberga mesmo sabendo que, em última instância, se destrói a si próprio. Isto lembra-me a célebre anedota da rã e do escorpião na qual este último pede à rã que o ajude a atravessar o rio assegurando-lhe que não a picará tanto mais que se o fizer ele também morrerá se bem que afogado. Durante a travessia ele pica a rã e esta antes de morrer pergunta-lhe porque fez isso, ao qual este responde que está na sua natureza nada podendo fazer quanto a isso. Também o comunismo “pica” o país no qual se instala. O comunismo é uma forma de suicídio colectivo que causa destruições muito mais profundas do que muitas das tragédias naturais, porque se trata de destruições de alma, privando um povo, do gosto pela liberdade, do espírito empreendedor, tornando-o algo acéfalo. A grande questão que devemos colocar quanto aos regimes totalitários é: Porque é este “bicho” homem que é capaz de criações tão belas como uma “Pietta” de Miguel Angelo, ou como as catedrais góticas, ou como a música de Bach (entre muitíssimas outras), cria regimes nos quais se autodestrói? Tudo isto nos remete para o mistério do Mal, algo ao qual aderimos cada vez que recusamos a Cristo, isto é, cada vez que queremos fazer a nossa vontade e não a d’Ele.